Hoje Eu Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro

hj eu quero

Segurando na mão do outro, ele tenta ensinar que relevo é linguagem. Mas o outro, sem nunca ter sido negado à sua condição de quem enxerga, resiste: “É impossível”, diz. Não é. Impossível mesmo seria ele, um menino cego, andar de bicicleta. Essa cena de Hoje Eu Quero Voltar Sozinho condensa várias das questões que o filme demarca dentro e fora dele mesmo. Dentro, porque estamos falando de uma história que naturaliza a poesia do improvável. Fora, porque nem o mais otimista dos produtores poderia imaginar que um filme sem elenco conhecido ou insumo publicitário da Globo Filmes pudesse estrear em 33 salas de 17 cidades brasileiras. O primeiro longa de Daniel Ribeiro é, portanto, esse menino cego cujo delírio de manobrar uma bicicleta se torna palpável. Vamos nos deixar então ser guiados por ele.

Baseado no premiado curta-metragem Eu Não Quero Voltar Sozinho, o longa é uma experiência mais profunda nas camadas de euforia hormonal da adolescência quando ela se depara com a inevitável curva do primeiro amor. O argumento dos dois formatos é o mesmo: menino cego, incônscio de que sua melhor amiga é apaixonada por ele, se descobre atraído por um novo aluno do colégio. Naturalmente, o filme que chega agora aos cinemas vai lidar com questões mais abstratas e complexas desse despertar lírico. Entram em cena a relação do protagonista com os pais, os limites que lhe são imputados dada sua deficiência física, fronteiras da amizade e o bullying na escola. Molduras que enriquecem a questão central do filme: é possível dar contornos morais ao amor quando não se vê? O exercício de desenxergar aqui não é uma privação, mas sim uma livre abdicação de preconceitos.

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