:: Filme na programação do Festival do Rio 2013 ::
É bem verdade que qualquer coisa que venha embalada na expressão “show de bola” vai me levar a correr distâncias dela. Mas considerando que a culpa neste caso é mesmo daquele sabido time de marketing que nasceu pra fazer as chamadas da Sessão da Tarde, há de se perdoar que o novo filme de Juan José Campanella (aquele que ganhou o Oscar por O Segredo de seus Olhos) e primeiro longa de animação estilo superprodução da Argentina tenha sido assim batizado no Brasil. E outra, apesar de argentino, o time vitorioso nesse filme veste verde e amarelo (?!). Portanto, é preciso aliviar.
A animação de Campanella, que monta o filme inteiro e ainda dubla quatro personagens na versão original em espanhol (mas é claro que as cópias aqui no Brasil já foram dubladas) é uma história sobre um menino com sérios problemas de autoestima que, com um jogo de totó/pebolim tentará evitar que sua cidade seja destruída por interesses imobiliários de um jogador de futebol megalomaníaco que ainda não conseguiu se recuperar da única derrota de sua vida. Confuso? Eu também achei. Mas esse aí é mais ou menos o argumento do filme.
Portanto, o que alguns personagens têm de simpático, o roteiro tem de emaranhado. Campanella, mestre em dirigir atores, fica em mãos com muita informação e pouca concentração. Os jogadores do time de totó que, a certa altura do filme, ganham vida própria, são uma história à parte. Eles sim são o grande charme dessa animação e deixam em vários momentos o personagem protagonista na sombra da trama. Amadeo, o rapaz que guia o roteiro, não é dos mais carismáticos personagens, até porque, na boa, fica difícil torcer pra alguém que não tem nenhuma outra ambição na vida a não ser jogar com seus bonequinhos de metal, Amadeo me parece quase sempre um rapaz mimado demais da conta.
Fica a sensação que os bonequinhos do Totó são os brinquedos de Toy Story sem o devido reconhecimento de sua soberania sobre a história de Andy, o dono desses brinquedos. E outra, o vilão não dá medo, ele é só chato mesmo. E claro, o 3D funciona quase nada, serve apenas para mais uma vez escurecer a paleta de cores.
Mas vamos lá: há excelentes momentos na história – e pra quem sempre argumenta que filmar futebol é uma das tarefas mais difíceis, esta animação faz tudo aquilo pela arte desse jogo que uma câmera nunca conseguiria realizar –, há também aquela ironia necessária à cultura dos über jogadores que ganham über salários e são über vaidosos e, melhor que tudo isso, há uma frase inesquecível que vale não apenas pro futebol, mas pra toda a ideia de “star system”: “As estrelas se apagam, craques envelhecem, mas os empresários são eternos.” Bingo! Isso sem mencionar os aspectos técnicos que, do alto de minha ignorância em Adobe Photoshop, me parecem muito bem afinados.
E para os que argumentarem que o filme tem muitas piadas internas de quem gosta de futebol e que, por consequência, isso pode afastar parte do público infantil (e nem vou falar de gêneros aqui, ainda que já esteja falando deles), tudo que tenho a dizer é: este filme é honesto com a filmografia às vezes um pouco nostálgica de Campanella e isso é suficiente para defender que ele não precisa calcular a quem se deve agradar.
De todo modo, é um filme que celebra o futebol como o esporte coletivo que ele deve ser. E é um filme que gosta de futebol. Mas não apenas para quem gosta dele. Isso não é o bastante para que ele seja excelente. Mas para a estreia da Argentina e de Campanella em uma animação desse porte, é um pequeno passo rumo ao tal grande salto.
Em tempo: Campanella comprou uma briga bonita com a Disney ao ver que as propagandas de seu filme foram banidas no Disney Channel. E escreveu assim: “Custo do filme: 20 milhões de dólares. Custa da entrada: 50 pesos (argentinos). Disney com medo da gente: não tem preço.” Tem mesmo não.